As palavras de Bertrand Russel nos dizem muito a respeito da nossa própria vida. O ser humano, ao natural, tem suas paixões, variando de pessoa para pessoa, umas mais e outras menos acentuadas. Estas três paixões, que Russel fala de sua vida, talvez sejam para todo/as. Podemos dizer que a ânsia de amar, a busca do conhecimento e a compaixão, são sentimentos normais em todas as pessoas. É difícil encontrar alguém que não tenha vivenciado essas três paixões. São sentimentos profundamente humanos e tão presentes na vida humana que podemos afirmar que foi Deus que os semeou no coração das pessoas.
E até onde posso falar sobre amor e conhecimento, sei que estes dons ou paixões ou dimensões da vida humana – como se pode dizer – possibilitam experiências de elevação e de êxtase imenso, como diz Russel. Então, poderíamos afirmar que o amor e o conhecimento nos dão uma amostra grátis do paraíso. E, na lógica da história de Bertrand Russel, a compaixão pela dor e o sofrimento humano, ao contrário, nos aproximam da terra, da realidade e da nossa pequenez.
Quem faz a experiência de saciar a ânsia de amar e a conquista do conhecimento, talvez possa esquecer que ao redor da Terra existem situações de sofrimentos e dores que devem ser transformadas. A própria espiritualidade pode acalentar nossas dores individuais e nos tornar pessoas tranquilizadas, sem indignação diante das injustiças que os outros sofrem. Com Jesus e seus discípulos aconteceu um momento de êxtase espiritual em que presenciaram a glória de Deus. Mas quando os discípulos queriam armar três tendas e permanecer na montanha, Jesus exigiu que descessem para continuar a missão (cf. Lc 9,28-36). Seja a espiritualidade, o amor ou o conhecimento, quando alcançados numa experiência de profundo prazer e bem estar, como Deus quer para todos, é preciso voltar ao chão da vida porque ainda há muita gente que não alcançou a dignidade perdida ou roubada.
E a compaixão nos faz sentir a dor do outro como própria. E quando lutamos para transformar as realidades de sofrimentos, dores e angustias, também sofremos e nos angustiamos por não ver a transformação sonhada. Parece que a compaixão faz duplicar a dor. Sofremos por ver o sofrimento de outrem e por nos sentirmos impotentes diante de tamanha realidade a ser transformada. A compaixão nos apresenta sempre mais e novos desafios. Cada luta traz outras lutas e cada desafio traz outros desafios. Parece mesmo que é para nunca parar, nunca deixar de lutar. Enquanto existir um ser humano sem dignidade, a nossa dignidade humana, de toda a humanidade não está completa. E numa visão ecológica, enquanto a vida – qualquer forma de vida – estiver ameaçada ou em degradação, é a integridade da vida – de toda a Vida – que está ameaçada.
Bertrand Russel falou de amor e conhecimento e acrescemos a espiritualidade, mas podemos considerar toda e qualquer forma de prazer e alegria como fontes de energia e vitalidade para fortalecer a compaixão, como um sentimento que através do qual podemos ajudar a resgatar nossa humanidade. É o exercício da compaixão, da solidariedade que faz as pessoas a se sentirem humanas e capazes de valorizar as coisas boas que com elas sucedem. Com disse Che Guevara, “Se você treme de indignação perante qualquer injustiça cometida contra qualquer ser humano em qualquer parte do mundo, então somos companheiros”. Quer dizer que se você é capaz de assumir a causa do outro que sofre, então somos irmãos, somos humanos. Esta é a prova de humanidade.