sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Acampamento Farroupilha e Acampamento dos Farrapos

Quando se ouve falar em “acampamento farroupilha”, não se tem dúvida de que se trata de um período específico em que grupos tradicionalistas se acampam em parques e praças para cultuar algumas das tradições que fazem parte da vida e da história do Rio Grande do Sul. É a chamada Semana Farroupilha dedicada ao resgate histórico de alguns elementos e fatos da Revolução Farroupilha e às homenagens póstumas para alguns de seus personagens. Enfim, no Rio Grande do Sul, praticamente todos sabemos como é este período próximo ao dia 20 de setembro. Todos os anos têm o Acampamento Farroupilha.

Na verdade, o Acampamento Farroupilha é uma experiência diferente do cotidiano da maioria absoluta do povo gaúcho. E revive um modo de vida que talvez não tenha sido experimentado por uma grande parte das gerações passadas. O modo de vida simples, campeiro está associado ao trabalho. É um cotidiano de lida no campo. Mas, quem faz esses acampamentos hoje em dia, simplesmente passam lá um tempo de férias e farras e não necessariamente revivem a vida simples de trabalho no campo. Contudo, enfim, o Acampamento Farroupilha tem o seu valor, porque ajuda a preservar certos costumes e resgatar alguns valores e princípios da vida do povo gaúcho. Além disso, o Acampamento Farroupilha também contribui para o exercício de relações fraternas entre as pessoas.


Mas, já que se fala em acampamento, precisamos lembrar que em nosso Estado também tem o “Acampamento dos Farrapos”. Sabemos que o termo farrapo era, inicialmente, pejorativo. Para deslegitimar a causa do movimento republicano, os imperiais procuravam desprezá-los e deprimi-los como pessoas, aplicando neles a alcunha de farrapos. Hoje não é diferente. Quando as classes mais pobres se organizam e lutam por seus direitos, também recebem denominações deprimentes. É o caso bem próprio hoje dos trabalhadores Sem Terra.



O Movimento dos Sem Terra reúne pessoas marginalizadas, oprimidas e resgata nelas a dignidade e o encorajamento para lutarem por seus direitos e alcançar uma vida digna. Mas, aqueles que se sentem “ameaçados”, que tem medo da justiça e da igualdade e não querem perder seus privilégios, eles também procuram deprimir a imagem de quem luta por seus direitos. É muito comum os pobres organizados, seja na luta por trabalho, emprego, terra, educação, saúde, moradia, questão de gênero ou étnica, serem tratados por termos pejorativos, como por exemplo, “vagabundos e baderneiros”. É uma forma que as elites encontram para deslegitimar a causa dos movimentos populares. A mídia e, infelizmente, alguns setores da educação, da religião e da cultura contribuem muito para isso e viram instrumentos de desrespeito.


Os Povos Indígenas sofreram muito este tipo de preconceito. Até as gerações de hoje, foram educadas numa tremenda campanha contra os Índios. Da mesma forma os Afrodescendentes, sempre tiveram seu modo de vida, sua cultura e religiosidade depreciada como uma tentativa de deslegitimar suas lutas por liberdade, igualdade e inclusão na vida social. Enfim, os pobres, de todas as etnias, na sociedade brasileira passam por isso, especialmente quando se organizam para combater a discriminação e as injustiças.


Podemos dizer que os farrapos de hoje não estão nos CTGs e tão pouco nos acampamentos farroupilhas. Eles estão acampados, sim, mas na beira de estradas. São os Sem Terra e os Índios, que não tem para onde ir. Os Negros nos quilombos, com suas terras reduzidas pela ambição e sempre à espera que a sociedade os respeite verdadeiramente.


O Brasil é uma nação rica, mas esquece que sua riqueza foi extraída e construída sob as terras dos Povos Indígenas e com o suor dos Afrodescendentes. Nossa sociedade também esquece que os pobres que clamam por terra e trabalho, são herdeiros de uma Pampa pobre e explorada. Onde alguns se apropriaram das terras, do ouro e da prata e agora se arrogam donos do que roubaram, desprezam os pobres e desqualificam suas lutas e seus objetivos, tal e qual faziam os imperialistas contra os farrapos.


Talvez um dia, nosso Estado e nosso País possam celebrar a conquista dos ideais dos Índios, Negros, Sem Terra, Sem Teto, Jovens, Mulheres e de todos que clamam por “Liberdade, Igualdade e Humanidade”, como ostenta a Bandeira Republicana do Rio Grande do Sul.

Um comentário:

Cristóvão Feil disse...

Muito bom, camarada.
Belo artigo.

Abç.

C. Feil (Diário Gauche)

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